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  • LMF São Carlos

Naji Nahas e o crash da Bolsa do Rio


Figura 1: Foto de Naji Nahas (#PraCegoVer)


Um drama envolvendo dinheiro, iates, viagens internacionais, corrupção, prata, coelhos charutos e manipulação do mercado: apresento-lhes a história de Naji Nahas e o Crash da Bolsa do Rio.


Naji Robert Nahas nasceu no Líbano, foi criado em Cairo e estudou em Londres. Chegou ao Brasil em 1969, com 22 anos e US$ 2 milhões (cerca de US$ 50 milhões em valores atuais), herança de sua família. Até mesmo sua chegada ao país foi conturbada, seu voo foi sequestrado por terroristas árabes e levado a Cuba. Por saber falar árabe fluentemente, acabou sendo o intermediador da situação. Anos mais tarde atuou novamente como intermediador, dessa vez entre os irmãos Hunt e bilionários árabes, numa tentativa de obter o monopólio do mercado de prata, mas essa história fica para uma outra hora.


Com o dinheiro de sua herança Nahas buscou oportunidades de aumentar a sua fortuna, abriu empresas, comprou fazendas, exportava coelhos. Em 12 anos construiu um império de 27 empresas.



“O meu grupo não pode ser mais diversificado. Eu tô em todos, desde a agricultura até as finanças, cubro quase todos os setores.” Naji Nahas, Jornal Nacional, 18/10/1982.

Mas foi na bolsa de valores que ele ficou famoso. Nahas chegou a ter 12% das ações da Vale e 7% das da Petrobrás, e isso só foi possível pois na década de 80 a bolsa era muito pequena. Uma de suas melhores jogadas foi em 1988, ele comprou várias opções de compra de ações da Petrobrás quando elas estavam em baixa.


Darei uma breve explicação de como isso funciona: pense que a ação da Petrobrás está R$ 10,00, ao comprar uma opção de compra, você adquire o direito de comprar a ação por um valor determinado, digamos que R$ 20,00. Como o preço de compra está muito acima do preço atual, essas opções tendem a ser baratas, vamos dizer que cada opção custa R$ 0,50. Se antes da opção vencer o papel suba para R$ 40,00 por exemplo, você compra as ações a R$ 20,00 e as vende na hora por R$ 40,00, lucrando R$ 20,00 a cada R$ 0,50 investidos.



Figura 2: Foto de Naju Nahas (#PraCegoVer)


Naji Nahas começou a fazer o preço dos papéis aumentarem depois de ter comprado aquela montanha de opções. E como ele fez isso? Comprando ações da Petrobrás, simples oferta e demanda. Isso só foi possível devido ao tamanho da bolsa, hoje em dia é extremamente caro para um investidor sozinho manter uma ação em alta por semanas. E mesmo na época, Nahas precisou fazer grandes empréstimos para comprar a quantidade de ações suficiente para empurrar o preço para cima. Conseguir tamanhos empréstimos não era tarefa fácil, mas nessas horas ter um iate ancorado em Mônaco realmente ajudava, bastava convidar os diretores dos bancos para assistir o GP de Fórmula 1, e se oferecer a pagar taxas de juros altas. Quando Nahas pagava o empréstimo, os diretores recebiam comissões enormes, e autorizavam o empréstimo novamente.


As ações da Petrobrás começaram a subir conforme Nahas as comprava, e quanto mais uma ação sobe, mais pessoas passam a comprá-las, gerando uma bola de neve. No vencimento das opções, as ações tinham valorizado 400%, e Nahas exerceu o seu direito de compra. O problema é que não havia tantas ações em circulação, pois uma grande parte estava nas mãos dele. Então quem vendeu as opções tinha que comprar as ações (advinha só) do próprio Nahas. Eles compraram a ação valorizada, para revender ao antigo dono por uma fração do preço que pagaram. Nessa jogada, ele ficava com as ações e com a diferença em dinheiro.


E isso foi só o começo, em um ano, Naji Nahas fez as ações da Vale subirem 1600%, do mesmo jeito que fez com a Petrobrás. O problema é que o esquema foi descoberto: é difícil convencer as autoridades que três empresas suas negociarem as ações entre si para fazerem o preço subir não é manipulação de mercado. O presidente da Bovespa então convenceu os bancos a suspenderem os empréstimos, mas os cheques, agora sem fundo, já haviam sido passados para a compra de mais ações. O prejuízo ficou com as corretoras, e a Bovespa confiscou sua carteira de US$ 500 milhões para cobrir os cheques. Após o episódio, Nahas foi condenado a 11 meses de prisão domiciliar.


Apesar da punição, quem sofreu mesmo foi o mercado financeiro brasileiro. Assim que a notícia se tornou assunto no Jornal Nacional, o pânico foi espalhado e a bolsa quebrou. Não se sabia o quanto da valorização daquelas ações foi por pura influência de Nahas. E se ele estivesse também no meio de outras valorizações? Até mesmo os papéis que não tinham sido manipulados foram colocados em dúvida. A única coisa que estava claro é que existia uma grande bolha prestes a estourar.


No dia seguinte a notícia, houve uma corrida de vendas e as negociações ficaram suspensas, assim que voltaram, as ações tinham perdido um terço de seu valor. O que salvou o restante da economia foi o fato de que a bolsa era pequena, não impactando muito no resto. Mas e se fosse hoje? É difícil mensurar o tamanho do problema, mas com certeza seria catastrófico.


A Bolsa de Valores do Rio de Janeiro nunca se recuperou do acontecido, perdeu credibilidade e o protagonismo passou todo para a Bovespa. Fechou em 2002.


Em 2004, Nahas foi inocentado de todas as acusações de “crime contra o sistema financeiro”, e em seguida abriu um processo contra a Bovespa, pedindo uma indenização de US$ 10 bi referente às suas ações confiscadas. Foi derrotado por decisão unânime.



Fontes:

VERGINASSI, Alexandre. Crash.São Paulo: Leya, 2011


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